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Matéria publicada pelo Valor Econômico, em 29 de outubro de 2025, com participação da Fiep, destaca impactos sobre a indústria madeireira do Paraná

Álvaro Fagundes, Marta Watanabe e Isadora Camargo
De São Paulo
Em 16 Estados mais afetados pela queda das exportações atingidas pelo tarifaço americano em agosto e setembro, em 12 houve medidas estaduais de apoio ao exportador. O impacto do tarifaço foi diverso. As quedas de embarques de produtos alvos do tarifaço aos EUA variaram de 8,9% a 99,9%. Dos 16 Estados mais afetados, 14 tiveram queda também nas vendas totais aos americanos.
Foram considerados entre os mais afetados os Estados mais dependentes, dos quais os americanos absorvem ao menos 5% das exportações. Paraíba, Amapá e Ceará também fazem parte desse grupo, mas as exportações de produtos atingidos pelo tarifaço nos três Estados cresceram em agosto e setembro ante iguais meses do ano passado, em 4,7%, 14,7% e 155,3%, respectivamente.
No agregado dos 26 Estados e Distrito Federal, mais da metade, — 15 no total — anunciou medidas para mitigar os efeitos das tarifas: Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina e Sergipe.
Os dados são de levantamento do Valor sobre medidas contra efeitos do tarifaço e sobre as variações nas exportações. Mesmo com ações para mitigar efeitos do tarifaço, alguns Estados tiveram quedas superiores a 50% nas exportações totais ao mercado americano entre agosto e setembro de 2024 para iguais meses de 2025, como Alagoas (59,9%), Rio Grande do Norte (63,7%) e Pernambuco (72,7%).
Entre os mais dependentes do mercado americano, somente cinco Estados tiveram alta nos embarques totais aos EUA em igual período. Na exportação aos EUA com origem em São Paulo houve redução de 16,8% de agosto a setembro ante iguais meses de 2024 para os produtos atingidos pelo tarifaço. Os isentos caíram 14,7% no mesmo período. O embarque total aos EUA somou US$ 2 bilhões em 2025, US$ 377,6 milhões a menos que em 2024, sempre nos dois meses.
Para amenizar os efeitos do tarifaço, o governo paulista lançou uma linha de crédito específica, o Giro Exportador, com total de operações já liberadas e aprovadas que ultrapassa R$ 40 milhões. Além disso, há mais de R$ 317 milhões em fase de análise. O Estado também liberou R$ 1,5 bilhão em créditos de ICMS como medida complementar.
Ricardo Britto, diretor-presidente da Desenvolve-SP, explica que é uma medida para dar fôlego ao exportador. "É um capital de giro para a empresa que muitas vezes imobilizaram recursos para exportar e precisa garantir o pagamento dos fornecedores e trabalhadores."
No Espírito Santo, foram disponibilizados cerca de R$ 60 milhões em crédito para os exportadores atingidos pelo tarifaço, diz Rogério Salume, secretário de Desenvolvimento do Estado. Ele conta que itens de exportação importantes do Estado, como o quartzito, ficaram isentas do tarifaço.
Foram atingidos outros produtos, como semimanufaturados de aço e café. Mas entre atingidos ou não, diz, o que se vê como reação das empresas é a busca da diversificação, porque já se começa a ter receio da segurança jurídica nas trocas com os EUA. "Mesmo que o produto tenha ficado isento hoje, pode ser que não esteja amanhã."
Para o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) Flávio Ataliba, é preciso que os setores repensem sua pauta exportadora, seja em variação de produto, seja em parceiro comercial. O tarifaço, diz, é um alerta para setores cuja exportação está concentrada em poucos clientes, essencialmente nos EUA.
No Paraná, dez produtos de exportação foram atingidos pelo tarifaço. O setor mais sensível foi o da madeira, que está presente em 266 cidades e, em algumas, representa cerca de 80% da ocupação da mão de obra. As tarifas já acarretaram perdas de US$ 65,4 milhões em cancelamentos de contratos entre agosto e setembro deste ano, em comparação ao mesmo intervalo de 2024. A queda dos envios de madeira foi de 32,8% no período, segundo a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep).
Superintendente da entidade, João Arthur Mohr explica que o mercado de madeira no Paraná é customizado para os EUA, o que colocou em xeque a atividade econômica de várias cidades que dependem do produto. Ele conta que três empresas paranaenses estão na berlinda, pois pararam suas linhas de produção. “O Estado não consegue deslocar o produto para outros mercados, enquanto pode demorar mais para alocar a madeira no mercado interno”, afirma ao Valor.
No momento, as empresas que, juntas, empregam 4 mil pessoas, fizeram um mix de demissões, férias coletivas e lay-off — quando dispensam funcionários para período de treinamento. Em paralelo, o governo estadual anunciou medidas de contenção, como liberação de impostos, como ICMS, e linhas de financiamento com juros subsidiados.
Um comitê de crise foi montado, principalmente pelo caso da madeira, o que Mohr considera serem ações paliativas de preservação de caixa, mas que não fream as perdas totais. A aposta, acrescenta, é uma renegociação acelerada das tarifas sobre os produtos. No caso da madeira, uma redução competitiva de 50% para a faixa de 10%, como o Chile, a 15%, como os países europeus, seria fundamental para “não desmontar o mercado”. Em um cenário ideal, se as negociações forem finalizadas entre 30 a 60 dias, o Paraná pode voltar a negociar com os norte-americanos em dezembro, prevê o superintendente.
Para Ataliba, o exemplo do Paraná reflete a armadilha que o grau de exposição da exportação brasileira a determinados países impõe às economias regionais. Em detrimento das ações de mitigação do tarifaço, os Estados brasileiros ainda concentram modelos conservadores de negociação internacional, dificultando a recuperação do prejuízo dos últimos dois meses.
Setores querem conversa ‘técnica’ com EUA
Isadora Camargo
De São Paulo
Associações dos setores mais afetados pelo tarifaço tentam conter a ansiedade em relação às negociações entre Brasil e EUA enquanto o cronograma das conversas ainda não foi definido. Entre o otimismo e a cautela, representantes ouvidos pelo Valor avaliam que a expectativa é que o governo brasileiro adote uma narrativa técnica e pragmática para defender a suspensão, ou ao menos a redução expressiva, das tarifas durante o período em que o acordo bilateral estiver em debate.
Para Marcos Matos, diretor-executivo do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), a melhor estratégia é priorizar produtos estratégicos, como o café. Segundo ele, há dois caminhos possíveis: uma redução significativa das tarifas para todos os produtos ou a ampliação da lista de isenções. Matos reconhece, no entanto, que uma isenção total é uma solução mais complexa e, portanto, menos provável de ser aprovada pelos EUA.
“Nós ficamos otimistas e celebramos esse contato, porque efetivamente nós entramos para o jogo e efetivamente se abriu o processo de negociação”, diz. Para ele, o Brasil tem as contrapartidas que os americanos querem, em especial, se priorizar a argumentação técnica com os negociadores americanos.
Além disso, o diretor do Cecafé, que esteve reunido com o vice-presidente Geraldo Alckmin na quinta-feira (23), aposta na figura “estudiosa” do político para aumentar o tom técnico do lado brasileiro na negociação.
Para reforçar o argumento em favor da isenção do café, Marcos lembra que a inflação do grão nos EUA subiu nove vezes entre agosto e setembro, pressionando o bolso do consumidor americano. Além disso, as importações de café brasileiro pelo país caíram 52,8% em setembro, na comparação com o mesmo mês de 2024, segundo o Cecafé. Os EUA, que já foram o principal destino do café do Brasil, haviam perdido a liderança em agosto, ficando em segundo lugar, atrás da Alemanha.
Nos casos da carne suína e de aves, além de ovos, o setor espera que prevaleça “pragmatismo” nas tratativas, salienta Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (Abpa). Para o representante, a expectativa é que prevaleça uma avaliação técnica sobre a complementaridade desses produtos no mercado americano.
“O Brasil ajuda a garantir oferta e estabilidade de preços para o consumidor dos Estados Unidos, sem provocar distorções. Esse entendimento, acreditamos, deve ser determinante para o restabelecimento de um ambiente comercial previsível e equilibrado para ambos os lados.”
Somadas, as exportações brasileiras de carne suína, ovos e tilápia aos EUA neste ano já passaram de 36 mil toneladas, gerando mais de US$ 90 milhões em receitas para o país, afirma Santin.
A indústria de calçados, concentrada no Rio Grande do Sul, também segue cautelosa em relação à redução de tarifas. “Temos um otimismo comedido neste momento, esperando que medidas concretas sejam tomadas nos próximos dias”, afirma o presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira.
Segundo o balanço mais recente da entidade, o setor só não perdeu mais, pois compensou as perdas de embarque aos EUA com o mercado latino-americano, principalmente com a Argentina.
O setor madeireiro, por sua vez, pressiona por uma redução rápida das tarifas para tentar restabelecer os negócios com importadores americanos ainda neste ano. A defesa é de que o corte das taxas não se limite ao período em que o acordo bilateral estiver em discussão.
Mesmo que as negociações se estendam, empresários destacam que a indústria brasileira praticamente adapta a matéria-prima para o mercado americano, sem ter alternativa viável para redirecionar o volume, principalmente no Paraná. O diagnóstico é do superintendente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), João Arthur Mohr.
Com as tarifas, o Estado deixou de embolsar US$ 65,4 milhões entre agosto e setembro deste ano, com queda das exportações aos EUA de 32,8% no período.
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