06/09/2007

Análise

Pressões socioambientais: coitado de vocês

Pressões socioambientais: "coitado de vocês"

 

É isso que John Elkington, tem a dizer aos CEOs que ainda não acordaram para  os desafios da sustentabilidade no século 21. Elkington veio do movimento ambientalista e fundou a consultoria SustainAbility há 20 anos. Ele imagina um mundo diferente, mas está preocupado. "Nosso recente estudo sobre globalização e sustentabilidade quase nos matou de susto", diz.

 

Em meados de junho, mais de mil pessoas participaram da conferência anual do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, em São Paulo. Nas salas de reunião e nos corredores do evento, um dos observadores mais atentos era o inglês John Elkington da SustainAbility, consultado por CEOs de empresas como Ford, Shell e DuPont, Elkington era um dos palestrantes convidados. Durante a abertura do evento, ele assistiu a um longo vídeo no qual presidentes de algumas das maiores companhias brasileiras expunham as razões que os levaram a apoiar a conferência. No filme, os executivos repetiam as mesmas idéias: a responsabilidade social está no DNA do negócio, a companhia sempre se preocupou com a sustentabilidade, a opção pela gestão responsável é parte do compromisso com o país. Muitos esperariam que Elkington - uma das principais lideranças mundiais da causa do desenvolvimento sustentável - apreciasse os depoimentos. Ele detestou. "Sabe o que eu penso quando vejo presidentes de empresas repetindo frases feitas como essas? Coitados de vocês", afirma. "Os homens de negócios realmente acham que suas empresas estão preparadas para os desafios ambientais e sociais do século 21, mas a verdade é que a maioria não tem idéia do que vem por aí."

 

Ações das empresas pela sustentabilidade

 

Na corrida pelo desenvolvimento sustentável, as empresas são levadas a repensar seus negócios e sua atuação na comunidade. Desafios ambientais e sociais pressionam as companhias para rever suas estratégias, aumentar o grau de transparência e se articular com outros atores na tentativa de influenciar mudanças em larga escala. As ações tradicionais, como os programas de responsabilidade social, são insuficientes para responder a esse contexto. No ambiente corporativo, a sustentabilidade será, antes de mais nada, um desafio de inovação.

 

A SustainAbility - fundada por Elkington em 1987, o mesmo ano em que foi popularizado o termo "desenvolvimento sustentável" - acaba de concluir um estudo sobre globalização e sustentabilidade que poderá mudar a maneira como diversas organizações (de empresas a ONGs) vêem o tema. No estudo, foram traçados quatro cenários para o futuro no que diz respeito à capacidade da sociedade de responder a pressões sociais - como a explosão demográfica - e ambientais - como o aquecimento global. Três dos cenários são decididamente pessimistas. No cenário otimista, as pressões são contornadas - mas não sem que, antes, o mundo se confronte com uma espécie de choque global. No que diz respeito à atuação das empresas, uma das principais conclusões é que a responsabilidade social tradicional será ineficaz diante das novas forças. "Não há nenhuma garantia de que as companhias hoje tidas como 'responsáveis' terão sucesso no futuro", diz Elkington. "Terão chances as que conseguirem inovar em seus modelos de negócios e encontrar soluções de mercado reais para os grandes problemas que o mundo enfrenta." A boa notícia é que os sinais de que isso é possível começam a aparecer. A seguir, algumas das principais constatações de Elkington:

 

Sobre as novas pressões "Costumo dizer que já vivemos três grandes ondas de pressões externas sobre as empresas ao longo da história. A primeira aconteceu nos anos 60 e 70, quando foram criados os primeiros organismos de proteção ambiental e as companhias foram confrontadas com novas regulamentações. A segunda aconteceu nos anos 80 e 90. Foi quando o movimento da responsabilidade social começou a tomar forma e as empresas decidiram se posicionar como 'boas cidadãs'. Dali em diante elas passaram a adotar normas e a participar de iniciativas voluntárias relacionadas à responsabilidade social e ambiental. Algumas levaram esses padrões para seus fornecedores e iniciaram diálogos com ONGs e comunidades locais. A terceira onda, relacionada à globalização e à governança, foi abalada pelos atentados de 11 de setembro. O que estamos vivendo agora é o retorno da terceira ou o início de uma quarta onda.

 

Há seis anos participo das reuniões do Fórum Econômico Mundial. É impressionante ver como temas como as mudanças climáticas, os riscos de pandemias globais e a corrupção entraram para valer nas discussões. O resultado é que os homens de negócios começam a se perguntar: que diabos eu preciso fazer diante disso tudo? Há pressões novas. Alguns anos atrás, Bill Ford, presidente do conselho de administração da Ford, me chamou para falar sobre a indústria automobilística. Ele estava preocupado e disse o seguinte: 'As pessoas dizem para os fabricantes de cigarro: vocês vendiam esse produto e sabiam dos riscos que ele oferecia à minha saúde. No futuro, os consumidores vão nos dizer: vocês vendiam esses carros e sabiam que os gases que saem dos escapamentos provocam o aquecimento global'. O que Bill Ford imaginava não demorou para acontecer.

 

Hoje, mesmo a comunidade financeira, que por muito tempo foi resistente, está acordando. Em 2006, participei de uma conferência na Califórnia na qual executivos de fundos de capital de risco falavam sobre aquecimento global. Eles pareciam o Greenpeace! A mensagem era: nós, capitalistas de risco, queremos investir em empresas atentas às ameaças das mudanças climáticas e ao desenvolvimento de energias renováveis. Há pouco, só cientistas queriam falar sobre isso."

 

Sobre responsabilidade social "As empresas que hoje têm programas de responsabilidade social e que se colocam como 'boas cidadãs' conseguirão responder aos novos desafios na escala que eles exigem? A resposta é: não. Não há nenhuma chance de que as Fords ou as Coca-Colas da vida dêem conta desses desafios com as estratégias tradicionais de cidadania corporativa. Na última década, as empresas criaram departamentos de responsabilidade social, publicaram relatórios socioambientais e passaram a conversar com os stakeholders. O problema é que muitos dos temas que perceberam como sendo questões 'de cidadania' eram, na verdade, profundamente estratégicos - e foram parar nas mãos de pessoas que não tinham relação alguma com os conselhos de administração. Isso é muito perigoso. Em cerca de três ou quatro anos, vamos olhar para o período atual como 'a era de ouro' da responsabilidade social. Muito do que está aí deixará de existir. Estamos num processo intenso de transformações e muitos executivos ainda não sabem como responder - o que não significa, é claro, que eles não possam aprender e se adaptar."

 

Sobre inovação "Uma empresa que recentemente despertou muita atenção foi a General Eletric Company. A GE sinalizou o que será importante no novo cenário: inovação e soluções de mercado reais para os problemas que o mundo enfrenta. Acredito que isso aconteceu porque Jeffrey Immelt, seu presidente, conseguiu sinalizar o que será importante daqui para a frente: inovação, criatividade e soluções de mercado reais para os grandes problemas que o mundo enfrenta. A estratégia Ecomagination, baseada no desenvolvimento de tecnologias limpas e produtos ambientalmente responsáveis, foi lançada há apenas dois anos e já rendeu uma receita de US$ 12 bilhões no ano passado.

 

Os pedidos dos clientes chegam a US$ 50 bilhões. É verdade que a GE é uma grande companhia e está acostumada a grandes números. Mas é possível que, em pouco tempo, esse seja o principal negócio da empresa."

 

Sobre novos modelos de negócios "Estamos incentivando as empresas a aprender com os empreendedores sociais e ambientais. São pessoas que estão criando novos modelos de negócios, novas tecnologias e novos estilos de liderança em busca de soluções para os problemas do mundo que possam ser replicados em larga escala. Veja o que a francesa Danone está fazendo na Índia. A empresa firmou uma parceria inovadora com o Grupo Grameen, capitaneado por Muhammad Yunus. Yunus ganhou o Nobel da Paz em 2006 por sua iniciativa no campo do microcrédito. Com a parceria, a Danone e o Grameen já concluíram a primeira das 50 fábricas de iogurte que construirão juntos em Bangladesh. A primeira custou 700 mil euros, mas a expectativa é de que a segunda fábrica custe 30% menos, permitindo que os habitantes locais se tornem acionistas do projeto. Os produtos são elaborados para ajudar crianças subnutridas a recuperar a saúde.

 

Franck Riboud, o principal executivo da Danone, diz que a iniciativa faz parte da campanha da empresa para estimular a 'globalização positiva'. Ele acredita que novos modelos de negócios podem tanto ajudar as multinacionais a se adaptar às novas pressões inerentes à globalização quanto atender às necessidades de pessoas que, até agora, ficaram fora do sistema de mercado. Riboud quer criar um novo modelo de negócios com a baixa renda não por caridade, mas com a idéia de dividir lucros. A parceria com o Grameen também poderá ajudar a Danone a desenvolver produtos inovadores para seus antigos mercados."

 

Sobre a agenda política "A GE faz parte de um novo movimento interessante nos Estados Unidos. Ao lado de empresas como Alcoa e Lehman Brothers e de organizações não governamentais como o World Resources Institute (WRI), ela é parte da Ação pelo Clima nos Estados Unidos (Uscap, na sigla em inglês). O grupo foi criado para pressionar o governo americano a criar regras e metas claras relacionadas ao aquecimento global. Diante de pressões sociais e ambientais, as empresas precisarão se articular para cobrar ações mais efetivas dos governos. O setor privado não tem como dar conta do recado sozinho. Sem governos mais eficientes e líderes políticos de qualidade, o desenvolvimento sustentável será impossível."

 

De onde vêm as pressões

 

Questões sociais e ambientais que já influenciam as estratégias das empresas:

Degradação ambiental e mudanças climática: O aquecimento global e o esgotamento de recursos naturais leva indústrias inteiras a repensar sua atuação - é o caso das companhias de petróleo

Pobreza: Cerca de 4 bilhões de pessoas vivem com menos de US$ 2 +.por dia. A inclusão dessas pessoas ao mercado consumidor - sem que haja degradação ambiental - é um desafio para os negócios

Preocupação com a saúde. Consumidores interessados em bem-estar trazem novas demandas. A preocupação com a obesidade provoca mudanças nas estratégias das companhias de alimentos

Exclusão digital. Em vários países, o acesso à tecnologia e à informação ainda é restrito. Empresas de telecomunicações e de informática estudam negócios relacionados à inclusão digital em áreas remotas

Articulação política. Desafios ambientais e sociais em escala global demandam novas relações entre o setor privado, os governos e a sociedade civil. A participação política será cada vez mais exigida das empresas

 

Fonte: Época Négocios. Agosto /2007

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