clique para ampliarclique para ampliar (Foto: Agência Fapesp/Eduardo Molina)

Um material polimérico e com características de hidrogel desenvolvido por pesquisadores brasileiros pode ajudar a responder a um dos desafios atuais da indústria farmacêutica: criar um sistema que permita a liberação controlada no organismo de moléculas com diferentes atividades farmacológicas contidas em uma única drágea.

Em um estudo apoiado pela FAPESP e divulgado na revista Applied Bio Materials, da American Chemical Society, cientistas das universidades de Franca (Unifran) e do Estado de Minas Gerais (UEMG) testaram o uso de uma classe de material conhecida como siloxano-poliéter – ou “ureasil” – para liberar no organismo de forma simultânea um anticancerígeno e um anti-inflamatório. Além de ações terapêuticas distintas, os fármacos usados na pesquisa também apresentam diferentes graus de afinidade por água.

“Conseguimos desenvolver um sistema para liberação simultânea de dois fármacos incorporados a uma mesma matriz polimérica [plástica]”, disse o professor da Unifran e coordenador do projeto à Agência FAPESP, Eduardo Ferreira Molina.

Flexível e transparente, a matriz polimérica é composta de segmentos em escala nanométrica (bilionésima parte do metro) de siloxano e de um poliéter (PEO). Com características de hidrogel (gel formado por uma rede rígida tridimensional de polímeros), o material é capaz de absorver volumes elevados de água em seus interstícios sem se dissolver e, por isso, é considerado ideal para liberação controlada de fármacos.

Por meio de um processo denominado sol-gel – no qual ocorre a transformação de um líquido com partículas em suspensão (“sol”) em um gel –, os pesquisadores conseguiram incorporar à matriz o anti-inflamatório naproxeno e o anticancerígeno 5-fluorouracil simultaneamente. “A ideia foi incorporar dois agentes terapêuticos sem alterar as propriedades físico-químicas da matriz polimérica ou dos fármacos”, explicou Molina.

O anti-inflamatório naproxeno tem caráter hidrofóbico, ou seja, não absorve água. Já o 5-fluorouracil é hidrofílico e, portanto, tem maior afinidade com o líquido. A incorporação de ambos à matriz de poliéter foi possível devido aos grupos funcionais presentes no material. “Isso possibilitou a ‘solubilização’ do naproxeno e do 5-fluorouracil”, explicou Molina.

Teste de liberação

A fim de testar e medir a liberação dos medicamentos foram feitos ensaios in vitro em que o material foi imerso em água com temperatura e nível de acidez (pH) similares aos encontrados no intestino humano.

A quantidade de medicamentos liberada na solução foi medida por espectroscopia no ultravioleta visível. Os resultados mostraram que o material foi capaz de liberar os medicamentos em quantidades iguais e manter a liberação ao longo do tempo.

“Esses resultados são inéditos. Até então, não havia nenhum relato na literatura científica da aplicação dessa classe de materiais para liberar de forma controlada dois agentes terapêuticos simultaneamente, na mesma quantidade, e manter isso ao longo do tempo”, disse Molina.

Efeito sinérgico contra o câncer

De acordo com o pesquisador, a ideia é que o material seja usado como drágea para encapsular e liberar controladamente uma série de agentes terapêuticos, entre eles quimioterápicos usados no combate ao câncer.

Uma das limitações dos quimioterápicos usados hoje é a quimiorresistência – a resistência de determinadas células cancerosas à ação do composto ativo. Sistemas de entrega de fármacos como esse descrito no artigo podem retardar o desenvolvimento da quimiorresistência, além de melhorar a eficácia terapêutica e diminuir os efeitos colaterais. Isso porque a combinação de diferentes agentes terapêuticos em um mesmo fármaco tende a promover um efeito sinérgico ou combinado, apontou Molina.

“Além de combater o câncer, um medicamento com esse sistema de liberação contendo um quimioterápico e outro agente terapêutico poderia diminuir os efeitos colaterais do tratamento”, disse.

Com informações da Agência FAPESP.

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