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O desafio de nacionalizar a frota naval

29 de setembro de 2011

Indústria atrai capital e tecnologia para dar conta da gigantesca demanda de embarcações do setor petrolífero

Celia Demarchi

Pelo menos sete grandes empresas têm projetos, iniciados ou à espera de licenciamento, para construir novos estaleiros ou ampliar suas plantas. Nem todas divulgaram quanto investirão nessas obras, mas os aportes chegam a pelo menos US$ 3 bilhões. O maior projeto anunciado, o da OSX em São João da Barra (RJ), está orçado em cerca de US$1,7 bilhão.

O investimento em estaleiros, de todo modo, terá de aumentar, e muito. Ou a indústria nacional - que atraiu capital e tecnologia de estrangeiras, principalmente asiáticas, para a tarefa de ampliar e nacionalizar a frota naval - não dará conta da gigantesca demanda de embarcações do setor petrolífero para as próximas duas décadas. Essa demanda explodiu nos últimos dois anos, após as descobertas do pré-sal e da produtividade surpreendente dos campos que já estavam sendo explorados.

Constituída atualmente de cerca de 300 embarcações, a frota de navios de apoio offshore às plataformas de petróleo em operação no país terá de quase dobrar até 2020. Nesse ano, a Petrobras estima que estará produzindo cerca de 5 milhões de barris de petróleo por dia, mais que duas vezes a produção atual, de 2,1 milhões de barris diários.

As perspectivas de mercado incluem a necessidade de substituir embarcações com bandeiras estrangeiras, que atualmente equivalem a algo em torno de metade das que operam offshore. Há necessidade também de renovação constante da frota, porque a vida útil desses equipamentos é de 20 anos, em média.

Além de navios de apoio, a indústria terá de prover o setor de petróleo de plataformas de perfuração. A Petrobras tinha, por exemplo, 44 plataformas SS e FSOP(Floating Production, Storage and Offloading)em dezembro de 2010, mas em 2020 precisará de 84. Os estaleiros estão correndo para atender à demanda de gaseiros e petroleiros da Transpetro. Por meio do Programa de Expansão e Renovação da Frota (Promef), a empresa integrará 49 novos navios à sua frota atual, de 53 embarcações, até 2014.

"A indústria naval precisará investir centenas de bilhões de dólares nos próximos dez anos para atender a essa demanda", afirma Roberto Monteiro,diretor financeiro e de relações com investidores da OSX, que tem como parceira, com 10% do capital, a coreana Hyundai, líder mundial do setor. A empresa, que ainda nem começou a construir seu estaleiro, tem carteira de pedidos de US$4,8 bilhões.

Do grupo EBX, a OSX está investindo US$ 1,7 bilhão para instalar uma unidade de construção naval no Complexo Industrial do Superporto do Açu, em São João da Barra, norte do Estado do Rio de Janeiro. Atenderá, prioritariamente, a petroleira do grupo, a OGX, que deve começar a explorar petróleo na Bacia de Campos até o fim deste ano.

As obras do estaleiro começaram em julho e a inauguração está prevista para o quarto trimestre de 2012, com operações como corte de chapas de aço e produção de estruturas para os módulos da plataforma OSX4. Será a primeira plataforma flutuante FPSO da OSX produzida e montada no país, a partir de casco trazido de Cingapura. Até entregar essa plataforma, provavelmente no segundo trimestre de 2014, a OSX terá abastecido a OGX com três plataformas fabricadas em Cingapura, das quais a primeira está a caminho do Brasil. Ao longo de 2014, o estaleiro deverá entregar mais quatro plataformas à empresa, que poderão ter, inclusive, cascos fabricados no país.

O estaleiro da OSX irá operar com nível asiático de produtividade, segundo Monteiro. Se todos os pedidos atuais forem confirmados, poderá construir e entregar sete plataformas offshore FPSO e nove WHP (Wellhead Platforms), fixas, até o fim de 2015. Monteiro diz que a metodologia de construção asiática é mais eficiente, porque envolve tecnologia que possibilita a utilização de blocos maiores na composição do casco.

Com capacidade de processamento de até 220 mil toneladas de aço por ano e um dique seco de 480 metros de comprimento, 130 metros de largura e calado de 11 metros de profundidade, o estaleiro da OSX ocupará, na primeira fase, 2,5 milhões de metros quadrados de uma área de 3,2 milhões de metros quadrados. Nessa configuração, poderá integrar até seis plataformas FPSOs e construir até oito WHPs simultaneamente.

A forte demanda do setor de petróleo está provocando ainda a descentralização da produção naval. Além de Rio de Janeiro e Pernambuco, o Rio Grande do Sul começa a se consolidar como polo dessa indústria. A EBR escolheu a cidade gaúcha de São José do Norte para instalar um estaleiro de plataformas de petróleo, no qual investirá cerca de R$1 bilhão, cuja licença ambiental é esperada até o fim deste ano.Para Alberto Padilha, presidente da EBR, subsidiária da Setal Óleo e Gás, o Rio Grande do Sul reúne condições ideais para o setor: terras planas, boa infra estrutura de acesso e população com bom nível educacional.

A companhia prevê inaugurar o estaleiro em 2013 e empregar 5 mil trabalhadores quando estiver operando em plena capacidade - processamento de 100 mil toneladas de aço por ano. Cada plataforma pesa entre 50 mil e 60 mil toneladas e é feita em cerca de 30 meses."Vamos produzir de forma sequencial, de modo a fabricar várias plataformas simultaneamente, porque temos de nos adaptar ao cronograma da Petrobras", diz Padilha.

É também no Rio Grande do Sul que a Ecovix, braço da Engevix, está começando a construir oito cascos para as plataformas P-66 a P-73 da Petrobras. Antes, comprou um estaleiro em Rio Grande, por R$ 410 milhões, porque a estatal exigia que parte do trabalho fosse executada na cidade gaúcha. A empresa informa que há previsão de ampliar a área para construção de sondas de perfuração, o que demandará mais R$ 300 milhões, e que tem intenção de participar da licitação para montagem dos módulos nos cascos.

A Wilson, Sons Estaleiros está investindo no Rio Grande do Sul, na mesma Rio Grande, onde constrói um novo estaleiro, de cerca de 150 mil metros quadrados, que absorverá US$ 155 milhões. Mas a empresa incluiu a cidade do Guarujá (SP) em seu mapa de investimentos: o estaleiro paulista está recebendo US$ 47 milhões, que possibilitarão duplicar sua capacidade produtiva, atualmente de dois PSVs e cinco rebocadores por ano.

Com os dois projetos, a Wilson, Sons multiplicará sua capacidade de produção por cinco, segundo Arnaldo Calbucci, vice-presidente da Wilson, Sons Estaleiros. "Vamos nos concentrar em embarcações de médio porte e maior valor agregado. A maior parte dos novos estaleiros se dedicará a grandes navios e plataformas de petróleo." O novo estaleiro atenderá à demanda do próprio grupo, em especial de embarcações de apoio marítimo tipo AHTS (Anchor Handling Tuc Supply), para ancorar plataformas.

De acordo com o executivo, o complexo de Rio Grande deverá concentrar, no futuro, toda a produção da empresa, que destinará à unidade do Guarujá (SP), mais próxima dos campos de petróleo, a docagem e manutenção de embarcações, inclusive de terceiros.

O Grupo Fisher busca investir para abastecer a própria demanda, ou seja,as necessidades desua Companhia Brasileira de Offshore (CBA). A frota da empresa, de 16 embarcações PSV (Platform Supply Vessels), receberá outras seis até setembro de 2012 e vai continuar se expandindo. Para isso, a companhia, que não divulgou o valor do investimento, construiu uma fábrica de metal mecânica de processamento de aço, a Aliança Offshore, em São Gonçalo (RJ), que deve começar a operar em outubro, e vai ainda ampliar o Estaleiro Aliança, em Niterói(RJ), criando uma área de reparos navais. A renovação da frota da Transpetro por meio do Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef) é outra fronteira de atração de novos estaleiros. A urgência da estatal justifica a adoção, desde o Promef I, lançado em2005, dos "estaleiros virtuais" -as empresas podem participar e ganhar licitações mesmo antes de construírem os estaleiros onde fabricarão os navios. O Promar, coordenado pelo consórcio formado pela STX Brasil Offshore e o grupo PJMR, é um exemplo de "estaleiro virtual", que será erguido no Complexo Portuário de Suape (PE), ao lado do Atlântico Sul, que ganhou licitação ainda na planta. O Promar venceu licitação da Transpetro para construir oito navios gaseiros, que entregará a partir de 33 meses do início das obras do estaleiro, o que está previsto para acontecer em setembro, segundo Waldemiro Arantes Filho, presidente do consórcio.

Na fase inicial, que deve ficar pronta em 20 meses, o Promar demandará investimentos de US$ 150 milhões, dos quais 70% virão do Fundo da Marinha Mercante (FMM), e ocupará 250 mil metros quadrados de sua área total, de 800 mil metros quadrados. Será o suficiente para, em cinco anos, processar até 20 mil toneladas anuais de aço para produzir equipamentos AHTS e PLSV (Pipe Laying Support Vessel): "Fomos pioneiros em construir esse tipo de embarcação no Brasil, em 1996", diz Arantes Filho, lembrando que em 1998, antes de se associar, em 2001, com a coreana STX, que tem metade das ações do Promar, a PJMR fabricou o primeiro PSV do país.

 

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