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Engenharia infinita em um mundo sem lixo

Publicado em 03/09/2019

Em geral, é entendido que “lixo” é todo “resíduo” descartado ou que não serve mais para o consumo ou que não poderia ser utilizado como insumo para a produção de novos produtos.

Cradle To Cradle (Do berço ao berço)

Cradle To Cradle (Do berço ao berço)

Todavia, na Quarta Revolução Industrial, a percepção do que é “lixo” ou “resíduo” já mudou de conotação haja vista a transformação de paradigmas no campo da produção que passa a ser tomada como contínua e cíclica e na qual os recursos deixam de ser apenas explorados e descartados sendo, efetivamente, reaproveitados ou reciclados em novos ciclos de produção. Nesta visão recursiva e inovadora surge um novo modelo mental de produção que se desenvolve na chamada Economia Circular.

Na Economia Circular, também, chamada de “cradle to cradle” (do berço ao berço) ou Indústria C2C, tem-se uma forma frontalmente oposta à concepção de que a vida de um produto deve ser considerada “do berço ao túmulo” que tanto caracteriza o processo industrial “linear” de extração, produção e descarte.

Centrada na “inteligência da natureza” a Indústria C2C tem por objetivo a instituição de mudanças de posicionamento quanto ao binário produzir-consumir haja vista que toma por base todo resíduo como matéria-prima para a produção de um novo produto. A Economia Circular opõe-se ao processo produtivo linear no qual, necessariamente, matéria-prima original se transforma em “lixo” ou “resíduo”.

No Modelo Industrial C2C não se considera a possibilidade de resíduos (não se trabalha sequer com a ideia de lixo) uma vez que é pensado que no processo de produção tudo pode (e deve) ser continuamente utilizado num novo ciclo de produção.

Na lógica circular de produção da Economia Circular é exigida a constante e contínua reutilização dos materiais de forma que cada passagem do ciclo extração-produção-descarte se torna um novo ‘berço’ para a geração de outros produtos.

O modelo linear de produção é substituído na Economia Circular pelo modelo circular de forma que os recursos sejam reutilizados indefinidamente para o contínuo emprego pela Indústria promovendo, efetivamente, sustentabilidade em todos os sentidos.

Economia Circular, ainda pouco difundida e utilizada no Brasil, está fundamentada na redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia sendo um novo conceito econômico de desenvolvimento sustentável o qual vem promovendo formas inolvidáveis de negócios e que está baseada em três princípios: eliminação de resíduos e diminuição da poluição, manutenção de produtos e utilização de materiais em ciclos de uso cada vez mais ampliados, e, regeneração dos sistemas naturais.

No Brasil, a Lei número 12.305, de 02/08/2010, instituiu a PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos) a qual estabelece “princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes para a gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos, as responsabilidades dos geradores, do poder público, e dos consumidores, bem como os instrumentos econômicos aplicáveis”.

A PNRS define, em particular, a LOGÍSTICA REVERSA como “instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”.

A despeito, porém, da PNRS em vigor no Brasil (já há quase duas décadas) o desperdício de resíduos que poderiam ser reutilizados, reciclados ou reaproveitados é enorme e tem se tornado desenfreado na medida em que as populações urbanas aumentam. Muito dos resíduos sólidos urbanos acaba parando em aterros e lixões ou, mesmo, é despejado diretamente na natureza.

Cabe salientar que os resíduos sólidos dispostos de forma inadequada na natureza são causadores de graves problemas ambientais tais como, por exemplo, a geração de doenças e a contaminação do solo e das águas provocando, também, a poluição da atmosfera quando são queimados.

Mas, não se deve esquecer, também, que, este lixo é gerado (exclusivamente) pelo ser humano. Ou seja, o lixo é um fenômeno genuinamente humano, não existe na natureza enquanto tal, pois no meio ambiente natural tudo agrega elementos de reconstrução, renovação ou adaptação conforme as naturais exigências.

Todavia, conforme ensina a Economia Circular, mesmo os resíduos sólidos podem ser reaproveitados “totalmente” gerando ativos econômicos em ciclos produtivos a serem estabelecidos no setor empresarial conforme os países desenvolvidos economicamente já o demonstraram de forma que é possível atingir o “lixo zero” e lucrar (e muito) com os correspondentes negócios associados.

No sentido precedente a Logística Reversa se mostra uma forte aliada da Indústria C2C uma vez que ao retornar o resíduo (“lixo”) para o ciclo produtivo o respectivo material deixa de ser resíduo (lixo) e passa a ser matéria-prima para a produção de novos produtos além de contribuir para a sustentabilidade. É sempre importante ressaltar que semelhante processo não tem fim (do berço ao berço, “cradle to cradle”).

Dadas as características peculiares do Brasil, que se mostra super desenvolvido e inovador em determinadas áreas, mas subdesenvolvido em outras tantas, a Economia Circular ainda não foi “pensada” completamente no país e se faz necessário evoluir do modelo linear para o modelo circular de produção na maioria das Indústrias Brasileiras. O Brasil necessita evoluir para inovar em termos de padrões de produção e consumo regenerativos. Assim, a Indústria C2C é uma realidade ainda a ser perseguida.

Embora a prática da Economia Circular seja crucial para se manter a geração de valor econômico sem a necessidade de aumentar a extração de recursos naturais para implantar a Indústria C2C no país é necessário entender as correspondentes vantagens e desvantagens e adquirir todo conhecimento que envolve uma economia regenerativa e restaurativa como é própria da Economia Circular.

Clara, então, é, também, a necessidade de reformulação dos Currículos dos Cursos Universitários que formarão os Profissionais do futuro para atuarem na Indústria C2C, principalmente dos Cursos de Engenharia. A concepção de Indústria C2C deve ser diretriz na formação do Acadêmico deste os primeiros períodos dos Cursos. O Profissional que atuará na Indústria C2C já deve possuir habilidades técnicas e posicionamento sobre como atuar em uma Economia Circular e não mais pensar a produção na Indústria como apenas linear e acabada (“do berço ao túmulo”).

No caso dos futuros Engenheiros, detentores de conceitos tais como Simbiose Industrial, “Double Loop”, “Closed-Loop”, Logística Reversa, Economia Espiral, Sustentabilidade, Análise de Ciclo de Vida de Produtos, “Upcycle”, dentre outros da Indústria C2C, estes mais adequadamente engendrarão soluções de problemas do mundo real interconectando a Indústria 4.0 com a Economia Circular sendo, também, os agentes de mudança do modelo mental para um mundo C2C.

No âmbito da Economia Circular, na qual não existe lixo, sugere-se uma Engenharia Infinita em um mundo finito no qual toda matéria-prima inicialmente utilizada na produção não gerará lixo, sendo tudo ou reaproveitado ou reciclado infinitamente.

Mas, há de se ressaltar, entretanto, que no Brasil é ainda tímida a existência de Currículos que formem Engenheiros para desenvolverem plenamente a Indústria C2C no Brasil. De forma geral, o próprio conceito de Economia Circular é incipiente no Setor Industrial Brasileiro e enfrenta não poucos desafios a vencer para a sua expansão.

Embora muito tenha que ser transformado quando à formação do Profissional que atuará na Indústria C2C há de se observar que conquanto a PNRS seja um importante agente para promover a implantação da Indústria C2C no Brasil, os impactos fiscais e os gargalos financeiros para cumprir a Legislação Brasileira de Logística Reversa e executar propriamente a Logística Reversa constitui outro dos difíceis desafios a vencer dado que é muito alta a tributação aplicada no correspondente processo. Em muitos casos, inclusive, existe bitributação pela produção que se baseia no Modelo Mental da Indústria C2C.

Estranhamente, vários produtos gerados com base nos pressupostos da Logística Reversa são novamente tributados mesmo que os mesmos tenham sido produzidos sem extrair novos recursos da natureza. Então, reformulações dos critérios de tributação das matérias-primas e recicladas no Brasil são urgentes para a redução de impostos a pagar para que as Empresas pratiquem a Logística Reversa e se desenvolvam segundo a lógica da Economia Circular.

Existem, certamente, muitos desafios a vencer para se implantar a Indústria C2C no Brasil e, resto, na maioria dos países em desenvolvimento ou, mesmo, em Nações do primeiro mundo quando ainda a Indústria se baseia no processo linear de extração, produção e descarte. Mas, como a Economia Circular beneficia tanto o meio ambiente quanto possibilita menores custos de produção e abre um novo horizonte no mundo dos negócios para a geração de ativos não anteriormente considerados sua implantação é inevitável.

Carlos Magno Corrêa Dias é Conselheiro do Conselho das Mil Cabeças da CNTU, Conselheiro Sênior do Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial (CPCE) do Sistema Fiep, Líder/Fundador do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Tecnológico e Científico em Engenharia e na Indústria (GPDTCEI), Líder/Fundador do Grupo de Pesquisa em Lógica e Filosofia da Ciência (GPLFC), Coordenador do Núcleo de Instituições de Ensino Superior do CPCE do Sistema Fiep, Personalidade Empreendedora do Estado do Paraná.

Fonte: FNE (Federação Nacional dos Engenheiros)

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